O seu autor, José Francisco Trindade
Coelho, nasceu a 18 de Junho de 1861 no Mogadouro e frequentou a Faculdade de
Direito da U. C. de 1880 a 1885. Naquele tempo, Trindade Coelho estudou praticamente
à sua custa, já que o pai lhe cortou a mesada depois de um chumbo logo no
1.º ano. Para tanto, foi “sebenteiro”, deu explicações e trabalhou como
jornalista.
O seu livro revela um apurado sentido
de humor e uma extrema jovialidade, que não seriam de esperar na personalidade
de alguém que teve de estudar a pulso e cuja vida profissional viria a ser
bastante complicada. Dá ideia que, enquanto escreve as suas memórias, Trindade
Coelho se vinga e liberta das injustiças de uma vida na qual já não se sentia bem
e que cedo decidiria abandonar, suicidando-se em Lisboa, a 9 de Agosto de 1908,
ou seja, 6 anos apenas depois de ter feito sair um dos livros mais bem-dispostos
que me foi dado ler!
In illo Tempore foi ao longo de todo
o último século um best-seller e é, ainda hoje, de leitura obrigatória para
quem queira conhecer a vida académica de Coimbra dos finais do séc. XIX (e, até
mesmo, do rodar para o séc. XX, já que Trindade Coelho nos relata também alguns
factos ocorridos entre a sua saída da Universidade e a edição do livro).
Ali se evocam episódios da vida
académica, das aulas, dos exames, das estúrdias, da praxe, das lutas políticas
de então, da vida citadina, da vida universitária, dos estudantes, dos lentes, dos
futricas, das tricanas, das brigas, dos amores e desamores, cuja leitura nos conduz
até à maneira de viver da Academia, aos seus costumes, aos seus tiques e às
suas gentes.
Ali, em cerca de 30 capítulos, de meia
dúzia de páginas cada, se passam em revista temas como a Festa das Latas, o Saraiva das Forças, o Orfeon Académico, a vida nas Repúblicas, os
cafés da Alta, o Centenário da Sebenta, as fogueiras de S. João, a cabra, as récitas
dos quintanistas, tudo nos sendo contado em jeito de estória à hora do café, com
graça, espírito crítico, algum veneno e bastante detalhe.
Para "cheirarmos" um pouco o estilo de
escrita de Trindade Coelho, aqui fica uma passagem deliciosa do capítulo “ASebenta”:
«No tempo em que eu andava em Coimbra,
ainda a boa e imortal sebenta reinava em todo o seu esplendor! Eu nem fazia
sequer ideia, ao chegar a Coimbra, do que vinha a ser isso da sebenta; mas,
industriado logo a tal respeito, vim a saber que era uma espécie de folhinha
litografada, formato 8.º, que saía todos os dias compendiando a explicação do
lente; que se chamava “sebenteiro” ao que a redigia; que custava sete tostões
por mês cada uma; que eram três em cada ano, visto as cadeiras em cada ano
serem três; e, finalmente, que, enquanto o lente explicava a lição para o dia
seguinte, só o sebenteiro ouvia o lente, e que os mais, todos, e eu portanto,
podiam muito bem ler o seu romance, fazer o seu bilhetinho e passá-lo ou
comentar os que vinham dos outros – ou então, se preferíssemos, dormir ou fazer
versos!
Não havia nada de melhor! Além disso, algumas metiam também as suas piadas; outras davam caricaturas – e sebenteiro havia que amenizava por tal forma aquela estopada, que até dava versos para o fado no fim de semana, e convocava os discípulos, em anúncios, para trupes aos caloiros, ou outras pândegas!»
Não havia nada de melhor! Além disso, algumas metiam também as suas piadas; outras davam caricaturas – e sebenteiro havia que amenizava por tal forma aquela estopada, que até dava versos para o fado no fim de semana, e convocava os discípulos, em anúncios, para trupes aos caloiros, ou outras pândegas!»
Dada a sua avançada idade, In illo
Tempore é hoje facilmente consultável na internet,
podendo ser lido a custo zero. Mas, para mim, a obra vale bem o esforço de aquisição
de um volume que ainda exista pelos alfarrabistas, se uma nova edição não aparecer,
entretanto, no mercado.
Boa leitura… ou releitura!
Zé Veloso
Creio que vou reler o«In illo Tempore» porque já o li...in illo tempore!
ResponderEliminarFernanda Marto