Se Coimbra teve uma Mãe, essa mãe foi a Alta. De facto, foi na Alta que germinou o primeiro embrião de vida do que viria a ser Coimbra, vai para milhares de anos; foi dentro das entranhas da Alta que Coimbra viveu os primeiros tempos; e, quando, já mais crescidinha, a menina se atreveu a sair para o arrabalde – a Baixa – era sempre debaixo das saias da mãe, ou seja, dentro das muralhas da Alta, que vinha acolher-se aquando das investidas das sucessivas hordas invasoras.
Mas se Coimbra teve uma Mãe, deve ter tido também um Pai. E aí é que a porca torce o rabo, confirmando a máxima de que "a mãe é sempre certa, mas o pai nunca se sabe... " Para dificultar esta questão, Coimbra é tão antiga que o seu registo de nascimento se perdeu na voragem da história, não se encontrando hoje vestígios da época pré-romana. Resta-nos, pois, ir à procura do pai pelos indícios.
Olhando em volta e procurando nas coscuvilhices das redondezas, não vejo outro candidato a Pai que não seja o Mondego, ainda que o maroto – que à época era muito mais vivo do que é hoje e, por certo, teria outros amores entre as serranias e o mar – nunca a tenha perfilhado. Mas os indícios são muitos. Se não, vejamos:
• a Alta e o Mondego namoram desde a Antiguidade, ele cantando-lhe à porta, ela acenando-lhe lá do alto;
• quando mais novo, eram frequentes as investidas do rio ao sopé da Alta – dizem os registos que as cheias chegavam ao altar-mor da Igreja de Santa Cruz – como frequentes eram os seus amuos, quase desaparecendo da vista da sua amada na época do estio;
• já com a filha crescida e desempenada, Mondego e Alta atingiram o período de acalmia, ele enroscado aos pés dela, espreguiçando-se ao sol, enquanto ela nele revê, espelhada, a sua vaidade de grande senhora;
• last but not the least, à noite, depois de terminado o bulício e apagadas que são as luzes das casas, continuam a dormir juntos.
• a Alta e o Mondego namoram desde a Antiguidade, ele cantando-lhe à porta, ela acenando-lhe lá do alto;
• quando mais novo, eram frequentes as investidas do rio ao sopé da Alta – dizem os registos que as cheias chegavam ao altar-mor da Igreja de Santa Cruz – como frequentes eram os seus amuos, quase desaparecendo da vista da sua amada na época do estio;
• já com a filha crescida e desempenada, Mondego e Alta atingiram o período de acalmia, ele enroscado aos pés dela, espreguiçando-se ao sol, enquanto ela nele revê, espelhada, a sua vaidade de grande senhora;
• last but not the least, à noite, depois de terminado o bulício e apagadas que são as luzes das casas, continuam a dormir juntos.
Aliás, o povo não costuma enganar-se e, por alguma razão, chama a Coimbra Cidade do Mondego e não à Figueira da Foz ou a outras terras ribeirinhas, remetidas ao estatuto secundário de meras amantes.
Passadas que estão as conjecturas de alcova, vamos aos factos históricos. O que levou a que Coimbra tivesse um desenvolvimento superior ao das outras povoações resultantes da fecundação do Mondego, desenvolvimento este que é muito anterior à instalação da Universidade e à própria nacionalidade e que viria a fazer de Coimbra a capital do reino, de Afonso Henriques a Afonso III?
A resposta é curiosa: ser um local de passagem, tanto terrestre (N-S) como fluvial (E-O), por vontade e culpa dos seus paizinhos: a Alta e o Mondego.
Comecemos pela passagem terrestre.
Desde a Antiguidade que quem se deslocava na faixa costeira entre o norte e o sul do território que dá hoje pelo nome de Portugal, tinha que fazê-lo passando por Coimbra. Por nascente de Coimbra não dava: tudo é serrania, a começar pelas serras do Roxo, Lousã, Buçaco e por aí fora; é na Alta de Coimbra que a serra começa... ou acaba. Por ocidente, a travessia do Mondego tornava-se imprevisível, dadas as cheias que alagavam o vale em cada Inverno. Por tais razões, Coimbra, junto ao Largo da Portagem (onde a dita era paga pelas mercadorias que entravam na cidade), sempre foi o melhor local de atravessamento do Mondego.
Isso mesmo acontecia ainda há três décadas, antes de terminada a A1, a qual, para fugir a Coimbra, obrigou à construção de um extenso viaduto sobre os campos do Mondego. Isso mesmo tinham já descoberto os melhores engenheiros de estradas da Antiguidade, vindos de Roma, que fizeram passar pelo Largo da Portagem, em Emínio (Coimbra), a célebre estrada que unia Olisipo (Lisboa) a Bracara (Braga), passando igualmente por Conimbriga.
Numa época em que o leito do Mondego era mais profundo, Coimbra foi um importante porto fluvial. Do interior das Beiras, os produtos eram escoados via Mondego pelas barcas serranas, das quais não resta hoje qualquer espécime original. Mas o que talvez muitos não saibam é que «foi na foz do Mondego que se cobraram à navegação estrangeira os primeiros direitos aduaneiros portugueses e que já em 1145 [2 anos antes da conquista de Lisboa!] as posturas municipais de Coimbra taxavam o preço da pimenta, sendo Coimbra o primeiro porto português em comunicação com o comércio do Oriente», conforme nos conta Jaime Cortesão no Guia de Portugal.
É frequente ouvir-se o lamento de que Coimbra tem sido essencialmente um local de passagem (de gerações e gerações de estudantes), não fixando nem gentes nem indústria, nem o mais que traz riqueza. É uma sábia lamentação, mas é inútil. A grandeza de Coimbra sempre se deveu, precisamente, ao facto de ser um local de passagem! Tiremos partido disso, já que quem por Coimbra passa raramente dela se esquece.
Zé Veloso
Excelente blogue que sigo fielmente. Parabéns.
ResponderEliminarGostei sim senhor. Um abraço Alice
ResponderEliminarParabens , muito interessante . começei a gostar desta cidade no dia q. minha filha saiu do Rio de Janeiro e foi estudar ai , sinto-me a vontade em suas ruas , domino uns poucos caminhos , mas sinto feliz por estar cada dia mais perto de Coimbra . Já tenho minhas preferencias e locais por visitar , acredito q. futuram. ficarei por mais tempo , abraços , Haroldo Ferreira .
ResponderEliminarBom trabalho.Quando sairá à cena o "Basófias"?
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